terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

POSSIBILIDADES DE RELAÇÕES ENTRE AS PRÁTICAS ORGANIZACIONAIS E A TEORIA DA PSICOLOGIA ANALÍTICA


Nelson Roberto Bertholi Jr

1. Introdução
Desde o surgimento da Escola Clássica de Administração, ou Taylorismo, a preocupação com a relação homem-trabalho se mostra relevante. Inicialmente, a problemática da Psicologia Industrial voltava-se para o aumento do rendimento do funcionário em seu posto de trabalho, fazendo surgir os primeiros estudos sobre a fadiga, as condições de trabalho e as relações humanas existentes no ambiente de trabalho.
Após a II Guerra Mundial, devido às diversas mudanças político-econômicas, foi necessário fazer transformações nas práticas a fim de atenderem a produtividade das empresas. A Psicologia, agora Organizacional,
deve preocupar-se também com a estrutura organizacional. É nesse período que surge o Fordismo e seu modelo revolucionário de linha de montagem. Surge aqui também a idéia de Desenvolvimento Organizacional, que seria o estudo dessas novas organizações fordistas, a fim de alcançar os significados construídos através de suas normas e valores e, assim, torná-los claros e compartilhados por todos. Para avaliar a adequação ao cargo do candidato era necessário agora, além de verificar o perfil individual, analisar se este se adequaria aos valores que permeavam a organização.
Através de estudos da Administração, no início dos anos 70, procurou-se compreender os fenômenos da produção e as influências do ambiente e da tecnologia na organização do trabalho. Desta forma, os estudos voltam-se para algo mais descritivo, explicativo e crítico, não tão prescritivos como antes. Começa a surgir aqui alguma convergência entre a Sociologia do Trabalho, a Administração e a Psicologia do Trabalho e, diante disso, vê-se o surgimento da terceira face.
A Psicologia do Trabalho direcionou seu foco para a compreensão do homem que trabalha e não exclusivamente para a produtividade, o que permitiu uma ampliação no campo de visão dos pesquisadores dando lugar a preocupação em relação ao bem-estar e saúde do trabalhador. Logo, com a influência de outras escolas de viés crítico, da saúde e mesmo a Psicanálise entre outras, multiplicaram-se as linhas de abordagem da Psicologia do Trabalho. Com o desenvolvimento de tecnologias e dos novos modelos administrativos, cada vez mais se exige o posicionamento e a participação da Psicologia do Trabalho no entendimento sobre o impacto destes no comportamento e no psiquismo humano.
2. Teoria Junguiana organizacional
Atualmente existem algumas poucas correntes no mundo que lidam diretamente com o inconsciente nas organizações (na sua maioria embasadas pela psicanálise freudiana), e de forma ainda mais tímida, alguns estudos trazem a psicologia analítica ao mundo organizacional, buscando utilizar os conceitos junguianos para a melhoria na qualidade da relação homem-trabalho, a partir da tomada de consciência, aumentando a possibilidade de escolha dos funcionários e chefia da empresa. Vem sendo utilizada também na estruturação de planos de carreira e trabalhos de desenvolvimento organizacional.
Através de uma revisão desses estudos, é possível observar que a correlação feita entre as práticas organizacionais e a teoria da psicologia analítica mostra a relevância do conceito de arquétipo. Os estudos feitos sobre cultura, clima e simbolismo organizacionais, sempre levam a uma busca a uma estrutura psíquica interior e coletiva nos indivíduos que determine tais fenômenos organizacionais.
Dessa forma, é possível notar a importância da teoria dos arquétipos e do inconsciente coletivo, para um maior entendimento da psicodinâmica organizacional e, utilizando a abordagem do simbolismo organizacional, pode-se ter uma visão mais abrangente e totalmente nova dessa dimensão organizacional, possibilitando o surgimento de novas práticas dentro da Psicologia Organizacional e do Trabalho.
No Brasil especialmente, através da psicóloga Elvina Lessa, a tipologia junguiana vem sendo difundida dentro das organizações. Essa teoria é muito utilizada para o trabalho de recrutamento e seleção nas empresas, através de dois questionários: o Questionário de Avaliação Tipológica (QUATI), e o Myers-Briggs Type Indicator (MBTI), que inclui um novo par de opostos: julgamento-percepção, permitindo determinar mais precisamente a função dominante. Ambos geram um quadro indicando as preferências que cada avaliado possui no momento da aplicação.
3. Possibilidades de práticas organizacionais
Na seleção de pessoal, o teste MBTI é utilizado para possibilitar a formação de equipes em que cada tipo complemente o outro de acordo com uma Planilha de Complementaridade, elaborado pela própria Elvina Lessa. Dessa forma, cada indivíduo pode buscar o autoconhecimento, desenvolvendo assim, suas funções menos desenvolvidas, e atingindo um maior equilíbrio pessoal. Tais equipes acabam funcionando como grupos terapêuticos, no sentido de que eles próprios causam o equilíbrio no outro. O psicólogo deve tomar cuidado ao utilizar a teoria junguiana com esse intuito, pois é necessário estar atento ao desenvolvimento dos grupos formados, por existir a possibilidade de que o indivíduo não se desenvolva, como conseqüência de estar ao lado de alguém com suas funções mais desenvolvidas.
O MBTI ainda pode ser utilizado no desenvolvimento do Plano de Carreira de um funcionário. A partir da identificação de seu perfil tipológico, é possível discutir possibilidades de atuação dentro da organização, em diferentes cargos. Utilizando-se das descrições de cargos da empresa, é possível, através de uma análise mais aprofundada, elaborar um “perfil tipológico” dos cargos, e dessa forma alocar os funcionários de acordo com o que seria o ideal para cada cargo.
O teste QUATI é muito utilizado como um processo de seleção, por ser um teste de personalidade. Este teste vem sendo muito utilizado ultimamente, tendo em vista sua fácil aplicação e correção, soma-se a isso o fato de sua aprovação em 2003 pelo Conselho Federal de Psicologia. O QUATI é utilizado para estabelecer um perfil do candidato juntamente com outros métodos, como dinâmicas de grupo, entrevistas, etc.
Dentro da teoria dos arquétipos, uma possibilidade de intervenção proposta por Roberto Ziemer, em seu livro “Mitos Organizacionais”, é a do diagnóstico e mudança da dimensão subjetiva das organizações. Para a obtenção dos dados para o diagnóstico, são utilizados instrumentos que incluem diversas imagens, metáforas, discursos, slogans, símbolos e histórias individuais e organizacionais, pois através desses elementos da psique individual e coletiva, é possível identificar, avaliar e transformar a subjetividade das empresas. Um exemplo disso encontra-se na análise da sombra organizacional que encontramos descrito no livro acima citado e que conseguimos, através desta prática, encontrar formas de conscientizar e melhorar questões relacionadas ao clima organizacional.
São relatadas ainda outras práticas relacionadas à cultura e ao clima organizacional, e geralmente são formulados pelos seus implantadores através de uma leitura da teoria com a realidade da organização específica. A teoria dos arquétipos é muito utilizada para tal. Alguns estudos de clima organizacional se referem à individuação como sendo um processo também existente nas empresas, onde o clima é diretamente relacionado à posição do indivíduo e/ou da empresa no processo de individuação.
4. Considerações finais
A teoria junguiana ainda tem diversas contribuições a fazer para as organizações, porém devem ser tomadas todas as precauções necessárias para que os testes, ou mesmo as intervenções desenvolvidas, não prejudiquem a dinâmica organizacional e mais ainda a psicodinâmica de cada indivíduo.
As intervenções que se utilizam da teoria da psicologia analítica, como foi discutido brevemente, atuam diretamente no inconsciente das organizações, ou seja, qualquer intervenção feita sem o devido cuidado pode ser extremamente prejudicial para todos. Da mesma forma como ocorre na clínica, uma ação direta em um inconsciente em que o ego não está estruturado, pode (e vai) causar grandes problemas para o organismo.
Portanto, durante o diagnóstico organizacional, é necessário perceber e fortalecer o “ego” da organização, observando a tolerância para mudanças, e a capacidade de suportarem conteúdos que possivelmente não são levados em conta na dinâmica organizacional.
REFERÊNCIAS
LESSA, Elvina. Equipes de Alto Desempenho. Vetor Editora, São Paulo. 2003. * www.elvinalessa.com.br
MORGAN, Gareth. Imagens da Organização. Atlas, São Paulo. 1996.
SILVA, Cristhyane Ribeiro Martins da. Simbolismo organizacional: adicionando a abordagem arquetípica.
ZACHARIAS, José Jorge de Morais. QUATI – Questionário de avaliação tipológica. Vetor Editora, SP.
ZIEMER, Roberto. Mitos Organizacionais: o poder invisível na vida das empresas. Atlas, São Paulo. 1996.

Indicações de leitura
ZACHARIAS, José Jorge de Morais. Entendendo os tipos humanos. Paulus, Série ententendo, 1995.

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