A cada dia estamos vendo mais e mais situações em que são estabelecidas relações de dependência. Vemos dependentes de drogas lícitas e ilícitas, dependentes de carinho e afeto, dependentes de atenção, dependentes da ação, do trabalho, do ódio, dos desejos... Podemos citar páginas e páginas aqui descrevendo essas dependências, principalmente se consideramos o mundo humano através de uma constante relação de dependência e independência, na qual ambas possuem seu lugar necessário.
Isso mesmo! Não taxamos dependência como algo ruim. A situação se complica, a nosso ver, quando não há um movimento no qual o indivíduo se liberte dessa condição. Em nosso processo de desenvolvimento somos dependentes em várias situações. A dependencia é inerente ao ser.
Todavia, ao não darmos atenção à sua contraparte, à independência, caímos numa condição de unilateralidade, um movimento de vida em que algo começa a faltar. Quando estes acontecimentos não são percebidos buscamos desesperadamente a extinção da angústia gerada através de um acúmulo de novas dependências a fim de amenizar aquilo que não queremos ver, tocar, viver. Possivelmente, buscamos novos pontos de dependência a fim de fugir de processos que levam à independência.
Neste sentido, a dependência nos apresenta apenas um lado da vida. Um lado necessário, mas que deve ser ultrapassado e reencotrado através da relação dialética existente entre dependência/indepedência, presente por toda a vida.
VIVÊNCIA ⇆ DEPENDÊNCIA ⇆ VIVÊNCIA ⇆ INDEPENDÊNCIA ⇆ VIVÊNCIA
Um ciclo é o que aqui estamos propondo, como a Uroboros engolindo o próprio rabo para logo após vomitá-lo. Caso contrário, não há movimento. Ou melhor, há um movimento circular e repetitivo. Lembremos da noção do empresário que, a fim de mudar sua empresa, fez uma mudança de 360º. Ele mudou sua empresa?
O movimento da vida não é circular e sim espiralado.
Mas não nos percamos apenas nesse aspecto nocivo e patológico da dependência. Talvez por detrás desta mesma dependência possa haver algo que mereça nossa atenção.
Se pensarmos que durante este processo o indivíduo permanece ligado a algo (muitas vezes até mesmo misturado com esse algo), seria então essa relação uma forma de ligar-se a algo no sentido de uma conexão com a alma, com as camadas mais profundas de sua psique?
Neste sentido, poderíamos entender esse processo de dependência como uma necessidade de se religar a algum conteúdo interno que ainda se encontra em sua forma mais primitiva, mais inconsciente e simbólica. Devido a isso a aparência tão pouco humana do desejo, um aspecto pouco trabalhado pelo eu? No sentido simbólico, esta dependência estaria a serviço de uma questão intrapsíquica maior, um religar-se (um religare, uma religiosidade) com aspectos pertencentes, talvez, ao self, mas sem uma organização saudável do processo.
Por este caminho poderíamos perceber de forma diferente o que há por debaixo de toda essa questão de dependência, o que ela realmente esconde em seus pormenores, em seus túneis e cavernas. E, talvez, a partir desta postura poderíamos auxiliar essa grande massa dependente.
Compreender essa relação leva à outras questões de grandezas também importantes. Fazer com que o indivíduo perceba esse movimento espiralado, no qual dependência/independência são partes que formam o uno, é colocá-lo em atividade na vida. Tornar-se ativo é tornar-se responsável pelo próprio processo, é promover uma expansão da consciência auxiliadora do processo de individuação.
A pergunta que se apresenta, então, é feita primeiramente a nós mesmos: Estamos prontos a encarar nossas próprias dependências e abrir mão destas em favor de uma independência responsável? Independência responsável pois seria uma nova caminhada rumo à novas dependências e independências. Afinal, quando abraçamos, com toda nossa fé, nossa própria independência, caímos novamente em nossa dependência pela independência. Unilaterais novamente, negando um lado da moeda, caímos em nossa própria armadilha.
Minha dependência é por algo que...!? Me sinto independente quando...!? Quantas vezes nos perguntamos isso durante o dia? Depende!?
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